Seria um longo inverno, o mais longo de todos os períodos daquelas
terras. Era estranho imaginar um inverno seco, sem chuvas, sem neve, sem
frio... apenas o chão seco e rachado, sem água, sem vida em qualquer canto. Mas
seria desse modo. O pouco verde que teimava em agarrar-se naquelas terras magentas,
desbotava suas cores à violência da luz solar. Os poucos animais rasteiros alternavam
partes de seus corpos uniformes no solo para não morrerem queimados em suas
peles. Haveria tristeza e desespero tão silenciosos naquela estação de inverno seco profundo... nem as vozes dos pássaros alegrariam os ventos parados naquela
região sonegada de chuvas. A dor nas costas da terra indicava este sofrer.
Conta uma lenda que há muitos séculos, onde hoje não chove
nem neva nem faz frio, havia vida, mas
esta se fora por uma briga que houve nos céus entre as nuvens e o sol... como o
egoísmo do mais forte foi maior do que o bom senso do amor coletivo, quem antes
amava fora vencido pela impaciência do Tempo... pois disseram que o Tempo não sabia
esperar, que ele corria implacável destruindo e (re)construindo as coisas. Então
aquele lugar virou um maciço de lembranças fossificadas, talvez nem com chuva
aquele chão voltasse a umedecer para brotar amor novamente nas ancas da terra.
Havia uma florzinha, que diziam suportar aquela solidão toda
de vida, e que brotava escondida diante do vazio instaurado pela seca do
lugar... mas era tão escondida e disfarçada que talvez até o olhar peregrino
mais atento e sedento de beleza e companhia, jamais pudesse percebê-la. A pequenina
erva se agarrava a todo custo ao que chamavam esperança. Suas raízes eram tão
profundas e fortes, atravessavam todo aquele deserto de almas, à procura de água
para sobreviver do lado de fora da terra.
E sendo uma das poucas sobreviventes àquela aridez toda, ainda assim
ninguém era capaz de saber que ela estava ali, à espera de uns olhos para
contemplá-la...
Seria o mais cruel e devastador inverno: sem chuvas, sem
neves, sem frio... sem vida. Uma tristeza maciça que de tão maciça se confundia
com a ausência de qualquer lembrança... e sem lembrança de nada, a impressão que
se dá é que nada nunca existisse. Esse era o pior dos abandonos: o esquecimento
por nunca ter tentado ver o que às vistas estava-se revelando. Seria sim, o
pior dos invernos... contudo, a Natureza é forte e segue adiante. Prevalece
sempre a sabedoria que transborda a vontade de permanecer.
Hellen Katiuscia de Sá
03 de abril de 2013, às 20:34H.
*ouvindo 'Shadow', de Ernst
Reijseger.
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