“o poeta é com efeito coisa leve, santa e alada; só é capaz de criar quando se transforma num indivíduo que a divindade habita e que, perdendo a cabeça, fica inteiramente fora de si mesmo. Sem que essa possessão se produza, nenhum ser humano será capaz de criar ou vaticinar.” [Platão]

sexta-feira, 9 de julho de 2010

LAGO NEGRO


Um pulmão no céu, outro no chão; estavam entupidos e resfriados. Concebiam vidas ligadas e intensas. Depois das vinte duas horas sorriam para as telas de cristais e transferiam códigos e preguiças... tudo por dados, abreviaturas, diminutivos. Sabiam-se um do outro e dos outros – uma sala cheia de gente. Conversavam e escutavam-se todos.

Eram sete; sol a pino. Desfazia-se do céu um pulmão. Na outra sala, outros códigos, outro mar – tantas coisas... eles falavam.

Depois que ela gritou, fizeram a vontade da sofrida; e quem gritou com estupidez engoliu a própria língua. Depois disso aliviou-se: veneno dos outros é macaco enforcado com o próprio rabo. E que rabo... a outra se enforcou!

Passou de cima para baixo e o peçonhento na barragem. Falava com seu veneno umidade, líquido, vapor. Quem o escutava, contaminava-se. Horrível despenhadeiro. Ela não quis aquele umbral derramando sobre as coisas. Passou reto, nem respirou – o pulmão do chão.

Avizinhava-se uma estrela, deixada de onde chegou antes. Brilhava para mim, que escrevo e que te falo, não aqui, mas lá, contigo.

Não ouvia terra, mas batuques das árvores ao vento da mata comprida.
Diáfanos mais diáfanos. Arregalou meus olhos indo varar minh’alma. Mas cá não estou; estou ali contigo...
E foi largado ao nada o peçonhento. Percebeu-me mais forte e invisível. Estava ele no esquecimento sem memória, portanto... não existia!

Várias mortes em fins-de-linha, a pior e mais dolorosa: o desprezo. Mais murros em ponta de faca. Sem estimativas. Cabo de guerra de uma ponta, apenas. Um pulmão no céu e urubus em circulo. Padecia o peçonhento, o apelido que lhe deram.

Sou lança.
Corpo de Luz num caminho reto.
Minha vida, e minhas mãos;
Não ali, mas agora contigo.


Katiuscia de Sá
05/07/2010

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