“o poeta é com efeito coisa leve, santa e alada; só é capaz de criar quando se transforma num indivíduo que a divindade habita e que, perdendo a cabeça, fica inteiramente fora de si mesmo. Sem que essa possessão se produza, nenhum ser humano será capaz de criar ou vaticinar.” [Platão]

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

AO MESTRE COM CARINHO



Hoje foi um dia muito especial para mim. Após enfrentar uma viagem de mais de duas horas na estrada, pude assistir as performances de meus colegas na Escola de Teatro e Dança da UFPA (etdufpa). Era incerto de eu poder assisti-los, mas como eu acredito que nada é em vão, os planos no meu trabalho foram mudados em cima da hora e eu pude retornar a Belém em tempo hábil.

Foi muito legal observar várias performances de mão dadas com o audiovisual (que também é minha paixão). Vi muitas coisas interessantes executadas pelos alunos da matéria “Performance I”, da Licenciatura Plena em Teatro/ UFPA, disciplina ministrada pela professora Karine Jansen. A maioria das performances estava alicerçada em gritar alguma crítica social, o que achei bastante louvável. Em minha opinião a Arte é um canal para dialogar poeticamente com a realidade, tornando-se uma ferramenta comunicativa que atinge esferas mais sofisticadas de compreensão, e portanto, gerando uma abrangência mais profunda sobre as coisas.

Entretanto, esse não foi exatamente o aspecto especial da noite de hoje. Ao ser convidada por dois alunos da professora Karine para ajuda-los em parte de suas performances através de vídeo-arte, eu tive a impressão de que a vida me ofertava a oportunidade de eu participar de algo dentro do fazer teatral, da qual estou afastada uns três/quatro anos. Fiquei satisfeita com este novo ‘chamado do palco’.

E a parte sagrada desse chamado foi eu, de alguma forma, compreender também uma possibilidade de religação com professora Karine Jansen. À época de quando fui sua aluna na etdufpa eu era bastante difícil de lidar, um pouco diferente na maneira de compreender e assimilar as coisas, e ‘sempre arredia’,(palavras perenes de prof. Walter Bandeira em relação a mim), e muitas vezes respondona também...

Havia momentos em que eu não queria executar os comandos que professora Karine me pedia às vezes nos exercícios teatrais... mas eu não fazia por mal, eu queria experimentar minha maneira de compreensão e execução das coisas, e minhas atitudes frequentemente eram vistas talvez como arrogantes por alguns professores (mas na minha cabeça não era isso, nem nunca foi), então prof. Karine e eu não tínhamos muita sintonia, o que gerava meu afastamento de suas orientações acadêmicas mais ainda. Normalmente eu queria saber o porquê das coisas e prof. Karine não sabia como chegar em mim e eu também a essa altura já não tinha muita paciência...

O que eu achei tão digno e belo – um momento sagrado, e tão espontâneo durante uma das apresentações de hoje, foi quando o publico tinha de abraçar alguns dos performers, eu assim o fiz e também disse que queria abraçar a professora. Mas esse abraço não era relacionado àquele momento, para mim foi assimilado como um carinho em agradecimento pela paciência e persistência de professora Karine em relação ao meu aprendizado teatral de anos atrás, e também uma tentativa dela compreender que eu nunca tive mágoa alguma pelas discussões entre a gente por conta de alguma passagem de quando ela foi minha professora de Teatro.

Eu senti que ela compreendeu. E o mais emocionante para mim, foi ao final das apresentações ao me despedir dela, também através de um abraço fraterno quando lhe segredei aos ouvidos: “Karine, eu quero lhe pedir desculpas pelas minhas pirraças à época em que fui sua aluna... você é uma excelente professora...” , eu queria dizer-lhe mais coisas, porém era pouco tempo. Sei que professora Karine Jansen compreendeu o que eu lhe disse de Alma para Alma.

Então Karine falou em alto e bom som, para todos na sala, foi divertido perceber que ela tinha um sorriso de satisfação e também surpresa no rosto: “Katiuscia estava me pedindo desculpas... ela foi uma aluna muito malcriada da época em que fui sua professora... mas eu nunca desisti”. Eu percebi que ela, enfim me compreende e eu a ela, e que também conseguimos alcançar um certo grau de sintonia, respeito e admiração uma com a outra, tudo fluiu com naturalidade e no tempo certo nesses quase quatro anos de convivência  furtiva e insistência dessa professora que nunca desistiu de mim como sua aluna. Para mim o maior ensinamento que ela me repassou foi incrivelmente resumido numa frase que ela me disse certa vez em sala de aula: “o ator deve estar sempre disponível”. A partir dessa frase aparentemente simples, um sol entrou na minha mente.

E foi com essa felicidade que retornei para casa. Com o coração leve e alegre por faze-la compreender que sempre a respeitei e que tenho admiração por essa mulher forte, guerreira que ama sua Arte e entrega-se a ela como sua respiração que lhe faz viver pelo e para o Teatro. É belíssimo vê-la e sentir isso. Obrigada por tudo mestra Karine Jansen. Você também me ensinou o significado e responsabilidade de repassar essa Arte Secreta do ator para gerações vindouras. Agora está bem claro essa disponibilidade perceptiva, eu poderia ler todos os livros do mundo sobre teatro, mas certamente nunca compreenderia este segredo como deveria.


Katiuscia de Sá
14 de novembro de 2012
23:49h

Um comentário:

  1. *no meu conto em formato de Diário-de-Bordo, eu faço referencia à professora Karine como a personagem "Generalzinho de Botas":
    http://hellenkatiuscia.blogspot.com.br/2010/04/presente-o-olho-direito-de-horus.html

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