“o poeta é com efeito coisa leve, santa e alada; só é capaz de criar quando se transforma num indivíduo que a divindade habita e que, perdendo a cabeça, fica inteiramente fora de si mesmo. Sem que essa possessão se produza, nenhum ser humano será capaz de criar ou vaticinar.” [Platão]

domingo, 11 de setembro de 2011

CÉU DO SERTÃO

(in memoriam) para meu vôzinho querido, que nasceu e viveu em Catolé do Rocha - sertão paraibano e que me contava suas histórias de infância nesse lugar inesquecível!


Seguir em frente.
Com pés descalços no chão em brasas, depois da guerra.
Cacos de vidros, pregos e destroços e os pés cortados sem parar pelo caminho...
É preciso seguir em frente sem olhar para trás.
Um rosto
As portas e janelas trancadas...
A chave para sempre!
Um passo a frente.
Abstrato.
A mosca vagava batendo-se nas vidraças,
Vazio,
Tristeza,
Solidão,
Abandono...
Tudo ainda dói.
Penosas lágrimas sem folego.
Nem chorar mais se conseguia...
Escuridão dos quartos e salas...
Não havia mais família,
Nem filhos,
Nem netos...
Sem futuro,
Nem passado,
Nem presente.
Uma lembrança solta pelo tempo esquecido para sempre.
Em teias de aranhas formigas prendiam-se a espera da morte.
Cem desesperos...
O maquinário continuava.
O relógio apenas dava as horas.
Tudo se perdia no tempo jogado fora...
O esquecimento ganhando.
Ele não chegou a tempo...
Será que ele não conseguiu chegar a tempo...?
Então a casa permaneceria fechada para sempre,
Sem nenhum móvel a receber assento?
Sem nenhuma janela a perceber o sol?
Sem nenhuma face a sorrir para dentro?
Era o deserto sem nuvens,
Um espaço claro e sem expressão
– meu céu do sertão!
E mesmo com aquela dor impenetrável...
Um desespero...
Uma solidão pungente,
Aquele céu de sertão brilhava...
Brilhava até cegar os olhos para nunca desistir...
O que se há de fazer é seguir em frente.
Mãos vazias,
Pés descalços no chão em brasas, depois da guerra.
Ninguém.
Não há ninguém.
Quero falar sua língua...
Essa é a minha dor...
Não sei mais voltar...?
A correnteza de Peixes
Vazou as marés...
Sem olhar para trás,
É preciso ir em frente...
É preciso seguir em frente...
Para brilhar o céu do sertão
"ainda há uma chance!"
É preciso seguir em frente...


Katiuscia de Sá
11 de setembro de 2011.

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